
Inteligência artificial reduz crenças em teorias da conspiração
Iniciativa do MIT baseada em tecnologia ChatGPT diminui crenças conspiratórias por até dois meses após interação

Mesmo que normalmente inverossímeis, muitas das chamadas teorias da conspiração conseguem atrair (e convencer) muitas pessoas. Uma grande preocupação atualmente, esse tipo de crença tem sido foco de pesquisas acadêmicas, uma vez que podem prejudicar esforços como a luta contra as mudanças climáticas e a vacinação.
Um lugar-comum sobre pessoas que adotam essas crenças é a noção de que fazem isso para reafirmar necessidades ou motivações que possuem. Por isso, não poderiam ser convencidas a abandonar esses pensamentos por meio de fatos ou evidências.
Pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, resolveram questionar essa premissa usando uma ferramenta nos moldes do ChatGPT, batizada de DebunkBot.
A ideia é fornecer evidências, de forma automatizada, para convencer as pessoas de que estavam acreditando em coisas impossíveis. Os resultados do estudo foram publicados na revista Science.
“Nossa hipótese era que intervenções baseadas em informação factual podem ser inefetivas simplesmente porque carecem de profundidade e personalização suficientes”, escrevem os autores.
Para testar a hipótese, os pesquisadores se aproveitaram dos avanços em grandes modelos de linguagem (LLM, na sigla em inglês), uma forma de inteligência artificial (IA) usada em aplicações como o ChatGPT.
Com acesso a grandes quantidades de informações, essa tecnologia tem ainda a capacidade de gerar argumentos sob medida para cada usuário.
As ferramentas podem inclusive refutar diretamente evidências citadas por cada participante do estudo para dar base às suas crenças conspiracionistas.
Bate-papo personalizado
Para testar o efeito do chatbot, os pesquisadores conseguiram a adesão de 2.190 pessoas. Os voluntários escreviam, em suas próprias palavras, uma teoria da conspiração em que acreditavam, junto com as evidências que dariam suporte à história.
As pessoas, então, mantinham três rodadas de conversa com a ferramenta, programada para responder especificamente à evidência fornecida pelo voluntário, enquanto tentava reduzir sua crença naquela teoria. Antes e depois, os participantes respondiam a um questionário sobre o quanto acreditavam naquilo, numa escala de 0 (Definitivamente falso) a 100 (Definitivamente verdadeiro).
Os pesquisadores concluíram que os participantes reduziram a crença na teoria da conspiração escolhida em 20%, em média. O efeito permaneceu por pelo menos dois meses.
As teorias eram das mais variadas. Uma vez que os participantes eram dos Estados Unidos, iam desde as clássicas envolvendo o assassinato de John F. Keneddy, a existência de alienígenas e dos Illuminati, até eventos recentes como a pandemia de covid-19 e as eleições presidenciais de 2020, em que Donald Trump foi derrotado por Joe Biden.
O efeito foi observado mesmo em participantes com crenças arraigadas, importantes para sua identidade.
Outro resultado significativo foi que a ferramenta não reduziu a crença em conspirações reais, como a Operação Northwood e a MKUltra, planejadas (e levada a cabo, no segundo caso) pela Agência Americana de Inteligência (CIA) entre os anos 1950 e 1970.
Depois que um avaliador humano analisou uma amostra de 128 argumentos feitos pela IA, verificou-se que 99,2% eram verdadeiros, 0,8% podia induzir ao erro e nenhum era falso.
Além disso, a ferramenta foi além, ao reduzir a crença em outras conspirações não relacionadas à que cada voluntário descrevia, “indicando uma diminuição geral da visão de mundo conspiracionista e um aumento das intenções de refutar outros crentes em conspirações”, escrevem.
“Muitas pessoas com crenças conspiracionistas aparentemente resistentes aos fatos podem mudar de ideia quando apresentadas a evidências atraentes”, afirmam os autores da pesquisa.
“De uma perspectiva teórica, é um retrato surpreendentemente otimista da razão humana: as ‘tocas do coelho’ [em referência ao livro clássico Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll] conspiracionistas podem ter uma saída”, concluem os autores.
Em termos práticos, o estudo enfatiza o potencial impacto positivo da IA, quando usada com responsabilidade, assim como a importância de minimizar oportunidades para a tecnologia ser usada de forma prejudicial.
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