
Competências essenciais para liderar a pesquisa em um mundo instável
Cenário geopolítico complexo exige que futuros líderes de pesquisa desenvolvam habilidades de gestão de crise, comunicação estratégica e formulação de políticas públicas

A resposta global à pandemia parecia anunciar uma nova era de cooperação científica internacional, com as fronteiras tradicionais entre governos, indústria e universidades sendo substituídas por modelos mais abertos, inclusivos e orientados ao bem-estar comum. Mas o cenário atual é bem diferente: crescentes tensões geopolíticas e disputas pelo controle de tecnologias críticas e emergentes obscurecem o horizonte.
Em períodos assim, os governos tendem a priorizar investimentos em militarização, deixando os cientistas com o desafio de convencê-los a investir em projetos que não necessariamente tenham um viés de defesa. A complexidade desse cenário e a imprevisibilidade do ambiente geopolítico global exigem cada vez mais novas habilidades dos líderes de pesquisa.
Um novo relatório lançado em março pela plataforma Science Business, em parceria com a editora científica Elsevier, destaca algumas delas. O documento foi elaborado com base em entrevistas com líderes europeus, mas suas recomendações são amplas o suficiente para serem aplicadas em diversos contextos. Entre as principais competências, estão:
- Capacidade de antecipar cenários de longo prazo, fundamental para equilibrar prioridades como transição verde e competitividade econômica;
- Envolvimento na formulação de políticas, por meio de uma comunicação mais eficaz de suas pesquisas para formuladores de políticas e tomadores de decisão, além de um relacionamento mais estreito com a sociedade;
- Mentalidade de preparação e gestão de crise, envolvendo a identificação antecipada de riscos para garantir a capacidade de agir em momentos de ameaça.
Segundo o relatório, é fundamental que as instituições de pesquisa forneçam suporte para o desenvolvimento dessas habilidades em futuros líderes por meio de programas de treinamento e educação direcionados. No entanto, embora haja consenso sobre isso, ainda falta um sistema de apoio estruturado. Para se ter ideia, somente um terço das universidades europeias oferece suporte desse tipo por meio de formação e capacitação.
Em resposta a essa lacuna, a Associação de Universidades Europeias, organização que promove a colaboração e a troca de conhecimento entre universidades do continente, em colaboração com um consórcio de parceiros, desenvolveu o projeto NewLead, financiado pelo programa Erasmus+, para avaliar os desafios envolvendo a capacitação de líderes
Capacidade de gerenciar crises
Segundo o documento, os futuros líderes de pesquisa deverão estar preparados para enfrentar desafios multifacetados e gerenciar crises de forma eficaz, com foco na diversidade e na responsabilidade compartilhada — dado que nenhum indivíduo é capaz de se destacar igualmente em todas as habilidades necessárias.
As futuras lideranças também precisarão ser inclusivas, com perfis provenientes de diferentes partes interessadas.
Segundo o relatório, a academia e as editoras científicas devem colaborar estreitamente para enfrentar os desafios crescentes impostos por práticas fraudulentas, como fábricas de papers e o uso indevido de ferramentas de inteligência artificial. Da mesma forma, a cooperação internacional é essencial e não deve ser comprometida.
Os formuladores de políticas devem incentivar um diálogo mais aprofundado entre os líderes de pesquisa e tomadores de decisão para compreender a complexidade das questões relacionadas à segurança, identificar soluções práticas e cooperar para desenvolver capacidade e resiliência. “O desafio reside em desenvolver uma abordagem sistêmica, em vez de depender de esforços individuais”, destacou o documento. “Isso requer colaboração e responsabilidade compartilhada.”
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