
Psyllium: benefícios à saúde e lacunas de pesquisa
Suplemento pode ser aliado do intestino e da saúde cardiovascular, mas faltam estudos robustos sobre eficácia e efeitos colaterais

Fibra solúvel derivada das cascas de sementes da planta Plantago ovata, o psyllium é usado para fins medicinais desde a Antiguidade, período que remonta à origem da escrita. Com popularidade crescente nos últimos anos, o psyllium tem sido usado como ingrediente funcional e nutracêutico – ou seja, um composto bioativo altamente nutritivo, usado como suplemento alimentar.
Um trabalho publicado neste ano no periódico Annual Review of Food Science and Technology fez uma revisão bibliográfica sobre benefícios à saúde, possíveis usos na indústria e potenciais efeitos colaterais do psyllium.
Os autores observaram que, embora seja amplamente usado como suplemento alimentar para beneficiar a saúde intestinal, há uma escassez de estudos científicos sobre as propriedades físicas e química do psyllium – e eventuais efeitos deletérios.
Há lacunas de conhecimento sobre o psyllium
Foram identificados poucos trabalhos que ajudem a compreender os efeitos secundários indesejados do psyllium – alertam os autores, vinculados a instituições da China e dos Estados Unidos.
Alguns desses trabalhos sugerem que o consumo da fibra pode dificultar a absorção de cálcio no organismo humano. “São necessárias mais pesquisas para uma compreensão aprofundada”, escrevem.
Interações medicamentosas
A pesquisa indica que, embora possa diminuir a absorção de certos medicamentos (entre eles lítio, carbamazepina, digoxina e levotiroxina), o psyllium também demonstrou potencializar os efeitos terapêuticos e mitigar eventos adversos de medicamentos como orlistate, mesalamina e hipolipemiantes.
“Essas descobertas sugerem que o psyllium pode inibir ou atuar em sinergia com a absorção de medicamentos, dependendo do contexto específico e da medicação envolvida”, avaliam os autores. Apesar das lacunas de conhecimento, eles ressaltam a importância do psyllium para a saúde, especialmente por sua estrutura fibrosa.
A fibra do psyllium resiste à digestão no trato gastrointestinal superior e é fermentada por bactérias intestinais no intestino grosso, produzindo componentes benéficos como ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), que atuam no metabolismo e na regulação da resposta imune quando o organismo é acometido por infecções.
A posição de agências regulatórias
A Food and Drug Administration (FDA), agência responsável pelo controle de alimentos e medicamentos nos Estados Unidos, aprovou o psyllium como ingrediente nutracêutico – observando que o consumo de 7 gramas ou mais da fibra por dia, juntamente com uma dieta baixa em gordura saturada e colesterol, pode ser eficaz na redução do risco de doença coronariana.
A revisão ainda destaca estudos que indicam benefícios do psyllium no controle dos níveis de açúcar no sangue (especialmente em pessoas com diabetes tipo 2), contribuindo para evitar picos de glicemia.
A FDA, no entanto, ressalva que as evidências científicas ainda são limitadas, não reconhecendo o psyllium como tratamento suficiente para o diabetes.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autoriza o registro de produtos compostos de psyllium, desde que sejam informadas (nos rótulos e peças publicitárias) alegações de propriedades comprovadas, como o fato de as fibras naturais auxiliarem no funcionamento do intestino.
Nos últimos anos, a Anvisa suspendeu o registro de produtos à base de psyllium cujas campanhas prometiam vantagens como eliminação de gordura, controle do apetite e perda de peso.
Assim como o psyllium, recentemente foi a vez do glucomannan (ou glucomanano) ganhar fama na internet com anúncios destacando suas supostas propriedades emagrecedoras.
Essa fibra solúvel, obtida da raiz do tubérculo Amophorphallus konjac, originário da Ásia, chegou a ganhar o apelido de “Ozempic natural” – uma alusão ao medicamento injetável que tem com princípio ativo a semaglutida, hormônio sintético que ajuda a controlar os níveis de glicose no sangue e sinaliza ao cérebro a sensação de saciedade.
A venda do glucomannan como suplemento alimentar é proibida pela Anvisa, que classifica esta fibra como aditivo alimentar, sem propósito de nutrir.
Psyllium: benefícios concretos
O trabalho publicado no Annual Review of Food Science and Technology apresenta múltiplos benefícios do psyllium para a saúde, com evidências geradas a partir de testes clínicos e pré-clínicos.
• Redução do colesterol: O psyllium é capaz de diminuir o colesterol total e o LDL (o chamado “mau” colesterol), contribuindo para a prevenção de doenças cardíacas.
• Controle da glicose: Apresenta potencial para reduzir o risco de diabetes tipo 2, melhorando a glicose plasmática em jejum e a hemoglobina glicada.
• Saúde gastrointestinal: É eficaz no alívio da constipação crônica e na redução da gravidade da síndrome do intestino irritável, além de modular a microbiota intestinal.
Outros eventuais efeitos positivos incluem: aumento da saciedade, atividades anticâncer de cólon e propriedades antioxidantes.
Além de seus impactos nutracêuticos, o psyllium se mostra um aditivo funcional versátil em alimentos. Segundo o artigo, alguns atributos permitem que atue como:
• Agente gelificante: Melhora a textura e inibindo a sinérese em produtos em gel.
• Substituto de gordura: Reduz teor calórico de produtos como iogurtes e cremes de avelã.
• Estabilizador de emulsões e substituto do glúten: Confere estrutura e melhora a estabilidade e as propriedades viscoelásticas em pães sem glúten e outros produtos de panificação.
A pesquisa também aponta para o uso do psyllium em sistemas de entrega de hidrogel, isto é, materiais com alta capacidade de absorção de água, usados para a liberação controlada de fármacos.
O psyllium pode ser utilizado, por exemplo, para liberar compostos bioativos de forma controlada e direcionada ao cólon, contribuindo no tratamento de doenças intestinais e câncer colorretal.
A modificação estrutural, seja química, enzimática ou física, pode ainda otimizar suas propriedades para aplicações específicas na indústria farmacêutica.
Por isso, os autores reforçam a necessidade de haver mais estudos abrangentes sobre as características físico-químicas e respostas fisiológicas do psyllium.
Na visão dos pesquisadores, o psyllium oferece base sólida para o desenvolvimento de produtos alimentícios aprimorados e aplicações industriais – com vasto potencial ainda a ser explorado nos campos da saúde e da qualidade alimentar.
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