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16.12.2025 Gênero

Equidade de gênero: quando a representatividade transforma trajetórias na ciência

Protagonismo feminino na pesquisa pode ser impulsionado por iniciativas voltadas à inclusão, formação e sororidade envolvendo toda a sociedade

Ilustração abstrata em tons quentes que representa mulheres diversas conectadas por fluxos de cor, simbolizando apoio mútuo, sororidade e trajetórias compartilhadas. As formas em movimento sugerem persistência, fortalecimento coletivo e a conquista de espaços pelas mulheres na ciência. Sororidade necessária: existe uma rede de apoio formada por grupos de mulheres cientistas em todo o Brasil; são mulheres que se ajudam, se fortalecem e abrem caminhos umas para as outras | Imagem gerada por IA

Acredito que experiências específicas de uma área podem servir de parâmetro para profissionais de diferentes áreas. Por isso, penso que minhas experiências como pesquisadora podem funcionar como uma espécie de guia para outras profissionais.

Afinal, a representatividade feminina é essencial também na pesquisa, e precisamos de referências.

De modo geral, quando se pensa em um cientista, quase sempre as pessoas imaginam um homem branco de cabelos brancos, mas essa não é a verdadeira imagem de quem faz ciência.

Por isso, além das atividades científicas e tecnológicas, atuo fortemente em iniciativas voltadas à promoção da equidade de gênero na ciência e na tecnologia, áreas que considero essenciais para o avanço sustentável e inclusivo da pesquisa no país.

Sou graduada em Química, com mestrado e doutorado em Ciência dos Materiais. Atualmente, desenvolvo pesquisas na área de Nanotecnologia, com foco em quatro principais linhas de atuação: produção de hidrogênio verde, desenvolvimento de células solares (especialmente as baseadas em perovskitas, materiais de estrutura cristalina relativamente raros), tratamento de efluentes e biomateriais.  

Apenas pelas características das áreas em que atuo as dificuldades já seriam muitas, mas o meu maior desafio, sem dúvida, é o de ser mulher em um meio científico no qual a presença masculina ainda é bastante predominante.

Justamente por isso, por enfrentar também barreiras inerentes à ciência, que em 2012 criei o programa Futuras Cientistas.

Esse programa, que há três anos alcançou nível nacional, já está presente em todas as unidades federativas do Brasil, incluindo instituições de ciência e tecnologia e empresas.

O programa nasceu como uma forma de aproximar meninas e professoras de escolas públicas das áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, conhecidas como STEM, na sigla em inglês.

Nessas áreas, nosso maior desafio continua sendo a baixa representatividade feminina, mesmo que as mulheres já sejam maioria na pós-graduação no Brasil.

O Futuras Cientistas é, portanto, uma iniciativa para transformar essa realidade, inspirando, formando e criando oportunidades para que mais mulheres possam ocupar seus espaços na ciência e na inovação.

Diversidade na ciência

A ciência é diversa, plural, feita por homens e mulheres, pessoas brancas, pretas, de diferentes origens e trajetórias. E isso é o que a torna mais rica e transformadora. Também por isso é tão importante termos mulheres cientistas em posições de liderança.

Isso porque o empoderamento feminino na pesquisa científica, incluindo nas chamadas ciências duras, acontece quando outras mulheres as veem nesses lugares, atuando e liderando grupos de pesquisa, e percebem que também podem chegar lá.

A representatividade inspira, abre caminhos e transforma possibilidades em realidade.

E é nesse sentido que minha experiência representa também uma espécie de parâmetro e inspiração para meninas e mulheres que sonham em ser cientistas em um país que ainda valoriza pouco essa presença, seja em laboratórios, seja em empresas.

Sei que o caminho na ciência pode ser difícil, especialmente para nós, mulheres, mas minha mensagem para outras mulheres é que elas não desistam. Afinal, hoje não estamos mais sozinhas.

Mulher negra desenvolvendo pesquisa científica em um laboratório
Equidade de gênero é uma conquista social indispensável também para o avanço da ciência e da tecnologia | Imagem: National Cancer Institute / Unsplash

Existe uma rede de apoio formada por grupos de mulheres cientistas em todo o país, mulheres que se ajudam, que se fortalecem e abrem caminhos umas para as outras.

A sororidade é necessária, e tem sido crescente também na ciência. A força dessa rede mostra que é possível resistir, persistir e conquistar espaços.  

Então, se mesmo em um pequeno ensaio eu puder deixar uma reflexão e um conselho às mulheres, seria: persistam em seus objetivos, encarem as dificuldades e conquistem espaços, porque vale a pena.

Busquem apoio, acreditem no seu potencial e sigam em frente, porque o seu lugar também é na ciência, onde a trajetória de cada uma fortalece a jornada de todas. Nesse contexto, a sororidade é essencial.

Redes de apoio

Nenhuma mulher está sozinha nessa caminhada. Estamos aqui para nos apoiar mutuamente, porque o que buscamos, de fato, é a equidade de gênero na sociedade como um todo, e a ciência é parte desse todo.

Importante lembrar: a equidade de gênero não é uma causa apenas das mulheres, mas de toda a sociedade. Precisamos de homens e mulheres conscientes de que lugar de mulher é onde ela quiser estar, inclusive como líder na ciência e na tecnologia.

A ciência é construída pela diversidade, e é essa pluralidade de mulheres diversas, homens, pessoas de diferentes origens e visões que fortalece a construção de um país com ciência e tecnologia para todos.

Para isso, precisamos ampliar oportunidades, romper barreiras estruturais e valorizar o talento feminino em todas as etapas da pesquisa, da iniciação científica à liderança.

A equidade de gênero não é apenas um princípio ético: é uma condição indispensável para produzir conhecimento de qualidade, inovar e transformar realidades.

Por isso, mulheres e meninas que desejam trilhar o caminho científico devem saber que há espaço, há apoio e há uma rede empenhada em garantir que seus projetos floresçam. Que cada uma avance com coragem, porque sua presença não é só bem-vinda – é necessária.

Afinal, a ciência só alcança todo o seu potencial quando todos podem fazer parte dela. O futuro que buscamos será construído pela pluralidade, e ele começa com as escolhas que fazemos hoje.

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Giovanna Machado é química, com mestrado e doutorado em Ciência dos Materiais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Pesquisadora titular do Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (CETENE), é integrante da Academia Pernambucana de Ciência e criadora do Programa Futuras Cientistas, vencedor do Prêmio LED – Luz na Educação, da Fundação Roberto Marinho. Também recebeu o Prêmio Women in Action, na categoria Inovação Social (2025), o Prêmio FACEPE/CONFAP de Ciência, Tecnologia e Inovação na categoria Pesquisadora Inovadora – setor público (2025) e o Prêmio Mulher Evidência Nacional, em reconhecimento à sua contribuição para uma sociedade mais justa e igualitária (2024).

Os artigos opinativos não refletem necessariamente a visão do Science Arena e do Einstein.

* É permitida a republicação das reportagens e artigos em meios digitais de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND.
O texto não deve ser editado e a autoria deve ser atribuída, incluindo a fonte (Science Arena).

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