
Apoio à ciência resiste à polarização e cortes nos Estados Unidos
Sete em cada dez norte-americanos reconhecem os benefícios concretos da ciência em suas experiências pessoais, segundo levantamento da ASTC

Mesmo diante dos cortes promovidos pela administração de Donald Trump e da polarização política nos Estados Unidos, a maioria dos estadunidenses continua valorizando a ciência. A conclusão é de uma pesquisa de opinião realizada em abril pela Association of Science and Technology Centers (ASTC) para mapear as atitudes e percepções do público em relação ao ecossistema científico do país.
O levantamento da organização sem fins lucrativos ouviu 1.017 adultos de diferentes idades e verificou que sete em cada dez concordam, ou concordam fortemente, que a ciência “beneficia pessoas como eu”, indicativo de que o apoio à ciência nos Estados Unidos está ancorado em experiências pessoais concretas.
A pesquisa também revelou alto grau de confiança do público em informações científicas para a tomada de decisões em seu dia a dia. Cerca de 94% dos entrevistados disseram recorrer semanalmente a conteúdos como:
- Previsões e alertas meteorológicos;
- Informações nutricionais;
- Projeções econômicas;
- Atualizações de saúde pública;
- Dados sobre a qualidade do ar.
No entanto, ao serem questionados sobre suas principais preocupações diante de cortes federais no orçamento da ciência, menos de 10% dos respondentes relacionaram o corte do orçamento para a ciência a uma possível desaceleração na produção de informações científicas que consomem cotidianamente.
Esse dado revela um paradoxo: embora usem intensamente informações científicas, poucos norte-americanos consideram os cortes de recursos para a pesquisa uma ameaça tangível e imediata capaz de prejudicar suas vidas.
Os maiores receios envolvem impactos econômicos, a preparação para novas emergências de saúde pública e a segurança de alimentos e medicamentos.
As respostas também mostram diferenças entre gerações. Entre os chamados baby boomers (indivíduos nascidos no período pós-guerra, entre 1946 e 1964), 27% manifestaram preocupação com a possibilidade de os Estados Unidos deixarem de ser líderes em ciência e tecnologia – índice bastante superior ao das demais gerações (18%).
Já entre os millennials (nascidos entre o início dos anos 1980 e meados dos 1990) e jovens da geração Z (nascidos entre o fim dos anos 1990 e o início dos 2000), a prioridade foi outra: as mudanças climáticas, apontadas por 16% contra apenas 6% dos baby boomers.
Não há rejeição sistemática à ciência
Ao mesmo tempo, muitos entrevistados revelaram ter apenas uma percepção limitada a respeito das mudanças recentes no apoio federal à ciência: 77% disseram ter ouvido falar em cortes ou alterações em programas estratégicos, mas apenas 15% foram capazes de detalhar essas medidas. Além disso, quase metade acredita que entidades privadas poderiam suprir eventuais lacunas desencadeadas por reduções no financiamento federal a instituições de ensino e pesquisa.
De modo geral, os resultados do estudo da ASTC indicam que, apesar das tensões recentes, parece não haver um movimento articulado de rejeição à ciência nos Estados Unidos.
Apesar de divergências profundas entre democratas e republicanos, a maioria dos eleitores republicanos expressou apoio à ciência e preocupação com os últimos cortes.
Ainda assim, algumas diferenças são evidentes: 91% dos democratas disseram estar cientes e preocupados com o risco de mudanças nas políticas federais, cancelamentos de programas e cortes orçamentários afetarem a capacidade do país de atrair e reter os melhores cientistas, contra apenas 55% dos republicanos.
O levantamento também revelou que os cidadãos estadunidenses desejam participar mais ativamente do debate científico, em vez de serem apenas receptores passivos dos resultados de estudos. Muitos manifestaram interesse em atuar como parceiros na forma como a ciência molda o futuro coletivo.
Outros achados importantes da pesquisa:
- 61% dos respondentes concordaram ou concordaram totalmente que “os cidadãos deveriam ter voz sobre se e como novas descobertas científicas são introduzidas na sociedade, considerando seus benefícios e impactos negativos”.
- 73% afirmaram que “os cientistas deveriam participar de atividades para aprender com o público sobre como seu trabalho afeta as pessoas comuns.”
- 74% defenderam que “as pesquisas científicas financiadas pelo governo federal deveriam estar livremente disponíveis ao público”.
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