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Livro apresenta evolução como fato científico

Publicação reúne evidências que solidificam a teoria da evolução de Darwin e discute como a ciência se posiciona frente ao negacionismo

Retrato do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882) produzido pelo pintor também britânico John Collier (1859-1934) | Imagem: National Portrait Gallery / Wikimedia Commons

Para fazer frente aos crescentes ataques negacionistas à teoria da evolução, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) decidiu que, em vez de polemizar, a melhor estratégia seria apresentar dados que comprovam a teoria do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882). 

Assim nasceu o livro A Evolução é fato (disponível gratuitamente em PDF), coordenado pelo biólogo molecular Carlos Menck, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB–USP), e escrito por 28 pesquisadores. 

“Nos 165 anos desde a publicação de A origem das espécies, de Darwin, em 1859, a teoria da evolução foi testada exaustivamente”, afirma a biomédica Helena Nader, presidente da ABC. 

De acordo com ela, o escopo da obra da ABC, que vai do Big Bang à evolução humana, foi crescendo para torná-lo mais completo e com mais exemplos brasileiros, o que justifica o atraso na resposta aos ataques à teoria, intensificados durante a pandemia de covid-19.

O livro mostra as principais evidências da evolução e as várias transformações pelas quais passou a teoria, que foi ampliada diversas vezes com novos dados. Uma das ampliações mais importantes aconteceu em 1942, quando as leis da hereditariedade do monge austríaco Gregor Mendel (1822-1884), que permaneceram ignoradas até 1900, foram usadas para formar a chamada síntese moderna evolutiva.

Sobrevivência dos mais aptos

O conceito mendeliano de gene ajudou a preencher uma lacuna no mecanismo da seleção natural proposto por Darwin, pelo qual os seres vivos mais aptos sobrevivem e se reproduzem, transmitindo características favoráveis às novas gerações. 

Darwin, no entanto, não sabia como surgiam essas características novas, chamadas agora de mutações, nem como elas eram transmitidas aos descendentes. 

Em 1953, a descoberta da estrutura do DNA e sua capacidade de guardar informações que depois são usadas para sintetizar proteínas – o chamado dogma central da biologia – detalhou os mecanismos da hereditariedade em nível molecular.

“Hoje sabemos que todas as células têm DNA e produzem proteínas, o que indica a existência de um ancestral comum de todos os seres vivos”, observa Menck, referindo-se ao último ancestral comum universal (conhecido pela sigla LUCA, em inglês), que teria vivido há cerca de 3,5 bilhões de anos.

LUCA, no entanto, era uma célula simples, sem núcleo nem organelas, como as mitocôndrias, que geram energia para as células, mas já com ribossomos, responsáveis pela síntese de proteínas. Esses ribossomos também são encontrados em todas as células conhecidas.

Em 1981, a bióloga Lynn Margulis (1938-2011) postulou que as organelas surgiram a partir de bactérias incorporadas pelas células, processo que ela chamou de endossimbiose.

“O sequenciamento do DNA que codifica os ribossomos e as mitocôndrias comprova que as organelas vieram das bactérias”, afirma Menck. 

Sequenciamento do genoma

O sequenciamento dos genomas dos organismos ajudou a elaborar a árvore da vida que Darwin começara a rascunhar. Esse sequenciamento, realizado em grande escala apenas a partir de 1995, confirma de forma geral o processo evolutivo dos seres vivos. Por exemplo, os dados indicam que a semelhança evolutiva dos humanos com os chimpanzés é de 98%, confirmando que o ser humano de fato teve origem em um ancestral comum com os macacos, como propôs Darwin – talvez o ponto de maior resistência à sua teoria. 

Por outro lado, o estudo de fósseis revelou que durante a evolução humana o ser humano não era único: a família dos hominídeos teve de 15 a 20 espécies, sendo que o Homo sapiens conviveu com algumas delas, inclusive os neandertais. 

Os fósseis continuam sendo a evidência mais visual e didática da evolução. Em 1869, por exemplo, o biólogo Thomas Huxley (1825-1895) levantou a hipótese de que os dinossauros deram origem às aves, com base em semelhanças na estrutura óssea desses animais. 

O naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), célebre pela obra A Origem das Espécies, na qual descreveu a Teoria da Evolução | Imagem: Wikimedia Commons

Quase um século depois, a descoberta de Deinonychus, um dinossauro com penas, corroborou a hipótese. Hoje, cientistas consideram as aves como os únicos representantes vivos dos dinossauros. 

“Todas as observações científicas, baseadas em evidências, comprovaram e ampliaram as ideias de Darwin”, resume Nader. 

O conceito de evolução está tão difundido entre os cientistas que é usado para definir possíveis formas de vida extraterrestre que serão procuradas pelos cientistas da agência espacial norte-americana, a Nasa. Segundo a agência, a vida pode ser definida, em uma de suas acepções, como “um sistema químico autossustentável capaz de evolução darwiniana”. 

Ou seja, esse organismo deveria ter um mecanismo químico para transmitir informações hereditárias, que pode ou não ser parecido com o DNA, e a capacidade se transformar ao longo das gerações por meio da seleção natural

Perguntas sem respostas

Nem tudo está resolvido na evolução. A teoria não explica de forma conclusiva como se deu a origem da vida. Uma das hipóteses mais aceitas sugere que os primeiros seres vivos usavam o RNA, e não o DNA, como molécula da hereditariedade

“Experimentos mostraram que o RNA pode ser formado a partir de substâncias simples que existiam na sopa primordial”, diz Menck. 

De acordo com o pesquisador da USP, essas moléculas têm atividade enzimática que pode ter dado origem à sua capacidade de replicação, como acontece no coronavírus, que replica a molécula de (RNA) para se reproduzir. 

A “Marcha do Progresso” (originalmente intitulada “The Road to Homo Sapiens”) é uma ilustração do artista austríaco-russo Rudolph Franz Zallinger (1919-1995), publicada em 1965 no volume Early Man da série de livro Life Nature Library. Ícone na cultura pop, a imagem é hoje rejeitada por grande parte dos cientistas, por representar a evolução como um fenômeno linear e progressivo. O biólogo evolucionista Stephen Jay Gould (1941-2002), no livro Vida Maravilhosa, ressaltou que a vida é um arbusto com muitos ramos, ceifados continuamente pelas extinções, e não uma escada previsível de progresso. 

“Esse tipo de vírus veio desses primeiros organismos, que viviam no chamado mundo do RNA”, diz Menck. Essas moléculas teriam desenvolvido membranas protetoras em torno do RNA, formando as primeiras células

 O próprio coronavírus é um exemplo de evolução em tempo real: é a mutação do RNA do vírus que dá origem a novas variantes que conseguem escapar do sistema imunológico. 

Entender essas mudanças genéticas, suas consequências no funcionamento do vírus e mecanismo de reação no organismo foi importante para desenvolver as várias gerações de vacinas em suas diversas linhagens. 

Apesar de todas essas evidências, diz Nader, a evolução não diz que Deus não existe

A pesquisadora, ecoando a posição oficial da ABC, afirma que a ciência e a evolução não são incompatíveis com a fé. Mas enquanto a segunda é de foro íntimo, a primeira depende de experimentação. 

“A ciência não diz nada sobre a fé, assim com o criacionismo e o design inteligente não conseguem explicar os fatos da origem da vida e da evolução. Só a ciência pode fazer isso.”

* É permitida a republicação das reportagens e artigos em meios digitais de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND.
O texto não deve ser editado e a autoria deve ser atribuída, incluindo a fonte (Science Arena).

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