
Abordagens integrativas podem ser aliadas da oncologia
Recomendações baseadas em evidências mostram, com ressalvas, benefícios de práticas como acupuntura, reflexologia e massagem em pacientes em tratamento de câncer

No começo de 2024, pesquisadores do MD Anderson Cancer Center, no Texas, Estados Unidos, publicaram na revista Current Oncology Reports um estudo de revisão a respeito da eficácia de abordagens integrativas no tratamento do câncer. A pesquisa analisou a promoção de hábitos alimentares saudáveis, atividade física, gerenciamento do estresse e suporte social, qualidade do sono, assim como produtos naturais e suplementos.
Os autores observam que, para além da suplementação com vitamina D, especialmente para aqueles com deficiência, e da possível adição de melatonina adjuvante de alta qualidade, nenhum produto natural ou suplemento é recomendado para reduzir a recorrência do câncer e prolongar a sobrevida.
O trabalho conclui afirmando que apoia “uma abordagem integrativa aos cuidados de saúde”, para “oferecer aos pacientes um plano de tratamento abrangente que leve a saúde ideal, qualidade de vida e maior sobrevivência ao câncer”.
Os autores também fazem ressalvas importantes, como a de que a medicina integrativa não deve substituir o tratamento convencional.
Reconhecem, ainda, que são necessários mais estudos sobre abordagens integrativas.
A revisão cita um conjunto de recomendações publicadas em 2022 e 2023, formulado com participação da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), que estabelece diretrizes baseadas em evidências para o uso de práticas de medicina integrativa em pacientes com câncer.
Um desses guias, publicado em setembro de 2022 em parceria com a Sociedade de Oncologia Integrativa (SIO), sugere que práticas como acupuntura, reflexologia, hipnose e massagens podem ser empregadas para aliviar as dores de pacientes oncológicos, levando em conta a literatura científica já disponível sobre esses procedimentos.
Outras abordagens, como a musicoterapia, não causam danos aos pacientes, mas têm menos apoio empírico por enquanto, de acordo com a publicação.
As diretrizes do grupo de trabalho conjunto da ASCO e da SIO, coordenado por Jun J. Mao, do Centro Oncológico Memorial Sloan Kettering, em Nova York, foram publicadas no Journal of Clinical Oncology.
No levantamento, Mao e seus colegas revisaram 227 estudos anteriores, tentando estimar a qualidade das evidências presentes neles.
Além dos especialistas, o painel incorporou um representante dos pacientes oncológicos que adotam esse tipo de terapia. A equipe fez levantamentos, nas bases de dados PubMed e Cochrane Library, sobre estudos publicados entre 1990 e 2021, incluindo tanto testes clínicos randomizados e controlados quanto revisões sistemáticas e meta-análises sobre o tema.
Os estudos deveriam incluir pacientes adultos ou pediátricos que sofriam com dores durante qualquer estágio do tratamento oncológico e recebiam intervenções integrativas para minimizar o problema (técnicas de prevenção da dor não foram incluídas). O desfecho primário deveria ser a redução da frequência ou intensidade da dor, e o número mínimo de participantes para cada estudo seria de 20 pacientes.
Com base nesses critérios, o total inicial de 1.346 artigos científicos analisados caiu para 227. Mesmo no caso dos estudos que satisfizeram os critérios de inclusão, a equipe destaca a considerável variabilidade metodológica e de desfechos primários.
“Essa diversidade impediu uma análise quantitativa, de modo que realizamos apenas uma revisão descritiva”, escrevem os autores.
No trabalho, Mao e seus colegas destacam que, além da dor causada pelo próprio tumor ou pelos efeitos dele em ossos, tecidos nervosos e músculos, os pacientes frequentemente precisam enfrentar dores desencadeadas pelos tratamentos oncológicos convencionais, como as que afetam as articulações, causadas por inibidores de aromatase, comumente usados contra tumores de mama, e as associadas à neuropatia periférica induzida por quimioterápicos.
Diante desses e outros quadros, eles concluíram que algumas práticas integrativas alcançaram uma qualidade de evidências considerada intermediária, sendo moderadamente recomendadas para pacientes oncológicos.
É o caso da acupuntura, indicada para tratar as dores nas articulações e nos músculos geradas por inibidores de aromatase em pacientes de câncer de mama.
Acupuntura
Nesse caso, um teste clínico de fase 3 (que avalia a eficácia) com 226 pacientes demonstrou, por exemplo, que a acupuntura é mais eficaz na redução da dor do que o uso de agulhas em pontos “falsos” (não estimulados tradicionalmente pelos acupunturistas) ou pelo tratamento padrão (apenas farmacológico).
Conclusões muito semelhantes foram obtidas no caso da reflexologia e da hipnose para quem passa por tratamento oncológico sistêmico, ou das massagens para pacientes oncológicos que passam por cuidados paliativos.
Quanto a abordagens como musicoterapia, a revisão da literatura médica indica que essas práticas tendem a trazer mais benefícios do que malefícios para os pacientes. No entanto, a qualidade das evidências é considerada baixa e, portanto, as diretrizes recomendam apenas “fracamente” o uso.
As evidências mais sólidas, por enquanto, vêm de estudos realizados com pacientes adultos. De acordo com o levantamento, os dados sobre o uso de práticas integrativas para minimizar a dor de pacientes oncológicos pediátricos ainda não alcançaram massa crítica suficiente para que seja possível fazer recomendações.
A bióloga Elisa Harumi Kozasa, pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein, chama a atenção para a necessidade de mais estudos. “Por enquanto, muito poucas terapias integrativas têm embasamento científico”, diz Kozasa, que trabalha com estudos em práticas mente-corpo, como a meditação e o yoga, que, de acordo com ela, têm uma extensa literatura científica dando embasamento.
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