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14.07.2023

O consumo de adoçantes

Estudo mostra que uso de edulcorantes pode causar problemas na maneira como o organismo absorve a glicose

Créditos: Shutterstock

Na última quinta-feira (13/07), o aspartame, um dos tipos mais comuns de adoçante, bastante usado em refrigerantes dietéticos, foi adicionado à lista de substâncias “possivelmente cancerígenas” da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS). As evidências científicas, no entanto, são limitadas, conforme ressaltou a entidade. Ainda não se sabe, por exemplo, quanto uma pessoa precisaria consumir para estar em risco de desenvolver câncer.

De acordo com outro órgão responsável pelo anúncio, o Joint FAO/WHO Expert Committee on Food Additives (um comitê misto da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura e da OMS), não há motivos para alterar a recomendação máxima diária, de 40 mg/kg. A  Food and Drug Administration (FDA), a agência federal de controle de medicamentos e alimentos dos Estados Unidos, indica que a ingestão máxima de aspartame pode ser de 50mg/kg.

Apesar das lacunas relacionada ao conhecimento sobre os efeitos do aspartame e de outros adoçantes no organismo humano, a OMS recomenda que as pessoas diminuam o consumo desses produtos, dando preferência ao consumo de água, em vez de refrigerantes dietéticos. Espera-se, agora, que o anúncio da OMS desperte mais o interesse da ciência pelo assunto.

Um grupo de pesquisadores do Instituto Weizmann de Ciência, em Israel, por exemplo, vem se dedicando ao tema. Recentemente, observaram que o uso de adoçantes que supostamente não carregam nenhuma caloria é capaz de causar problemas na maneira como o organismo humano absorve glicose. Isso porque tais compostos provavelmente afetam os micróbios que colonizam o sistema digestório.

Os resultados vêm de um estudo conduzido no Weizmann e podem indicar que há mais riscos do que se imagina na estratégia de usar essas substâncias de forma ampla para substituir o açúcar na alimentação.

“As possíveis implicações clínicas dessa resposta ao uso dos NNS [sigla inglesa de ‘adoçantes não nutritivos’] merecem ser alvo de estudos futuros”, pondera um dos responsáveis pelo trabalho, Eran Elinav, do Weizmann.

“É importante destacar que nossas descobertas não implicam de modo algum que o consumo de açúcar, já demonstrado como algo deletério para a saúde humana em muitos estudos, seja superior ao dos adoçantes não nutritivos”, esclarece Elinav.

Em entrevista ao Science Arena, Elinav explica que o consumo de açúcar deve ser evitado ou minimizado, especialmente em populações que são suscetíveis a doenças metabólicas, como obesidade e diabetes, ou já sofram delas. Na pesquisa, publicada em edição recente do periódico científico Cell, a equipe israelense e seus colaboradores na Alemanha e nos Estados Unidos avaliaram os efeitos de quatro tipos de NNS amplamente usados pela indústria alimentícia: sacarina, sucralose, aspartame e stevia.

Uma prática comum no emprego comercial desses adoçantes é o acréscimo de cerca de 5g de glicose aos sachês, cujo papel é dar volume ao produto e evitar o retrogosto potencialmente desagradável dos NNS. “Considera-se que essa quantidade de glicose é muito pequena [para trazer algum efeito sobre o metabolismo]. Mesmo assim, para separar os efeitos dos NNS dos possivelmente ligados a essa pequena quantidade, nós utilizamos dois grupos de controle. Um deles não consumia nenhum sachê de adoçante, enquanto o outro recebia apenas esse pequeno acréscimo de glicose”, explica Elinav.

Segundo a equipe, uma das motivações para o trabalho é a heterogeneidade dos resultados do uso costumeiro de adoçantes em humanos, de acordo com a literatura científica. Alguns estudos indicam que há alguns benefícios do emprego dos produtos para o perfil metabólico das pessoas, enquanto outros mostram que seu uso não tem efeitos detectáveis ou, dependendo do contexto, pode até ser prejudicial à saúde.

Indícios mais positivos parecem vir de estudos com modelos animais, cujas variáveis são mais fáceis de controlar. Mas, mesmo nesses casos, também há considerável heterogeneidade nos efeitos dos NNS.

A hipótese dos pesquisadores do Instituto Weizmann era que essa variabilidade poderia ser influenciada pelo microbioma do sistema digestório, que tem papel importante na absorção de nutrientes e muda de forma considerável de pessoa para pessoa, em parte por causa da dieta. Estudos in vitro e com animais já tinham sugerido que os NNS são capazes de afetar esses micro-organismos e influenciar o aparecimento da intolerância à glicose, típica do diabetes.

Estudo

Para investigar essa possibilidade com mais detalhes, a equipe idealizou um estudo randomizado e controlado com 120 adultos saudáveis. Um detalhe importante é que foram recrutados apenas voluntários que não faziam uso de adoçantes antes da pesquisa.

Divididos em grupos de acordo com os tipos de adoçante e os respectivos controles, eles receberam uma dose diária de sachês de NNS para consumo, a quantidade era inferior ao máximo considerado seguro pela indústria, ao longo de duas semanas. Antes do início da participação dos grupos no experimento, eles passaram por uma análise de seu microbioma, com o objetivo de comparar o perfil desses micro-organismos após o uso dos adoçantes com o cenário que prevalecia anteriormente.

As análises revelaram que o microbioma oral e o das fezes dos participantes mudou de perfil após as duas semanas de consumo dos NNS, independentemente do tipo de adoçante utilizado na alimentação. Além disso, nos grupos que consumiram sacarina e sucralose, a resposta glicêmica dos participantes piorou.

“Usamos o teste de tolerância à glicose (GTT) que é usado com frequência para medir a resposta do corpo ao açúcar consumido”, diz Elinav. “Isso significa que esses compostos provavelmente não são inertes no organismo humano. Quanto mais alto o valor do GTT, mais difícil é para o corpo processar esse açúcar, o que pode aumentar o risco de diabetes.”

O que diz a indústria?

Representantes da indústria de adoçantes criticaram o trabalho. Em comunicado oficial, a ISA (sigla inglesa de Associação Internacional de Adoçantes) argumenta que não é possível usar os dados obtidos pelo estudo como indícios dos possíveis riscos dessas substâncias para o metabolismo.

“Em contraste com a hipótese apresentada pelos autores de que os adoçantes de baixas ou sem calorias podem afetar o metabolismo humano através da alteração da microbiota intestinal, uma revisão recente da literatura concluiu que existem evidências claras de que mudanças na dieta não relacionadas com o consumo de adoçantes de baixas ou sem calorias são, provavelmente, os principais determinantes da mudança da microbiota intestinal. De fato, a dieta adotada pelos participantes, embora registrada, não foi totalmente controlada nesse estudo. Portanto, não se pode descartar o impacto de outros aspetos da ingestão alimentar”, diz o texto divulgado pela ISA.

* É permitida a republicação das reportagens e artigos em meios digitais de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND.
O texto não deve ser editado e a autoria deve ser atribuída, incluindo a fonte (Science Arena).

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