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27.07.2023 Câncer

Aposta na terapia celular

Alternativa de tratamento pode ser usada quando opções farmacológicas não surtem efeito em pacientes oncológicos

Ilustração: Bruna Martins/Estúdio Voador

Como grande parte da população é portadora do citomegalovírus – nos Estados Unidos estimativas mostram que entre 50% e 80% da população adulta positiva quando o teste é feito, números semelhantes ao do Brasil – é comum que ele ative um quadro infeccioso logo após um transplante de medula óssea realizado em pacientes com algum tipo de câncer hematológico, como leucemias e linfomas. Se o transplantado for imunossuprimido, as chances de complicações sérias, e até fatais, não são desprezíveis.

“Em pacientes que realizam transplante de medula óssea e que apresentam um período em que a imunidade ainda não está completamente restabelecida, o citomegalovírus pode reativar e vir a causar doença em vários tecidos e órgãos como trato gastrointestinal e os sistemas nervoso e pulmonar. É a maior causa de morbidade e mortalidade no pós-transplante”, afirma a imunologista Luciana Martí, pesquisadora do Einstein.

As terapias farmacológicas disponíveis para evitar os malefícios do citomegalovírus em pessoas transplantadas não dão resultados eficientes em uma parcela de pacientes. Por isso, vários grupos de pesquisa ao redor do mundo apostam na terapia celular para tentar preencher a lacuna deixada pelos tratamentos convencionais.

É verdade que o próprio transplante de medula óssea já é uma espécie de terapia celular, feita há bastante tempo, mas pouco conhecida por esse nome. As chamadas terapias celulares avançadas, pesquisadas hoje em várias partes do mundo, progrediram muito nas últimas décadas devido a melhorias na genômica.

No caso do estudo brasileiro, o caminho escolhido não é o da reprogramação celular – feito em outros trabalhos para se buscar tratamentos contra cânceres ou cardiopatias. A metodologia envolve o uso de pequenas sequências de proteínas virais, os peptídeos, para primeiro expandir as células que se quer obter. Em seguida, é como se os cientistas conseguissem ‘pescar’ aquelas células que respondem especificamente ao  citomegalovírus.

Menos efeitos colaterais

As terapias celulares em geral estão gerando avanços nas normas e leis e dentro dos laboratórios – que precisam ser ultra-limpos. No Brasil, a regulação sobre o tema avançou recentemente, com a publicação da portaria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – (Anvisa) 505/2021. O texto do órgão federal estabeleceu as regras correntes para o registro dos produtos de terapias avançadas no Brasil.

Em relação ao estudo coordenado por Martí no Einstein, os resultados, mesmo em nível mundial, são promissores. “Conseguimos expandir e selecionar células imunes (linfócitos T que atacam o citomegalovírus) com respostas antivirais bastante específicas. É uma terapia que não existe no Brasil”, explica a pesquisadora. “Em relação às outras disponíveis no mundo, o nosso método conseguiu produzir linfócitos com alto grau de pureza e com respostas bastante específicas. Portanto, com menos efeitos colaterais que as demais técnicas.”

O trabalho está na fase pré-clínica. E, agora, o formalmente chamado Dossiê de Desenvolvimento Clínico de Terapia Celular Avançada (DDCTA) está em vias de ser aprovado pela Anvisa. Após o sinal verde do órgão regulador vai começar a fase inicial dos testes clínicos.

“A primeira linha de tratamento para as infecções por citomegalovírus no pós-transplante é o antiviral. Os pacientes que não respondem ficam sem opção. Por isso, esse procedimento que estamos desenvolvendo poderá ser uma opção segura para os pacientes que não respondem ao tratamento convencional”, afirma Martí. 

O projeto em estudo no Einstein tem o apoio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional (Proadi) do Sistema Único de Saúde (SUS). A iniciativa, criada em 2009, é uma parceria entre seis hospitais de referência no Brasil e o governo federal. O intuito é capacitar recursos humanos, além de desenvolver pesquisas, tecnologias e melhorias em geral na gestão da saúde pública.

“Os nossos resultados vão ajudar também todo o SUS”, afirma Martí. Além do Einstein, participam do Proadi o Hospital Oswaldo Cruz, a Beneficência Portuguesa de São Paulo, o Hospital Sírio-Libanês, o Hospital Moinhos de Vento, de Porto Alegre, e o Hospital do Coração (HCor) de São Paulo.

* É permitida a republicação das reportagens e artigos em meios digitais de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND.
O texto não deve ser editado e a autoria deve ser atribuída, incluindo a fonte (Science Arena).

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